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Artigo | Inteligência Artificial e Direitos Autorais: é possível uma relação harmoniosa?
Com a introdução de novas modalidades tecnológicas, maior é a demanda por estudos para adequá-las à legislação, com o objetivo de garantir segurança jurídica em equilíbrio com o seu desenvolvimento. Porém, como assegurar isso a uma nova ferramenta, em constante mudança e sem legislação específica?
Nesse cenário, há um caso recente que envolve ações judiciais por direitos autorais e pela proteção da propriedade intelectual. De um lado, o The New York Times (NYT), um dos mais renomados meios jornalísticos de comunicação dos Estados Unidos. Do outro, a Open AI, empresa de desenvolvimento tecnológico com projetos focados em inteligência artificial, tendo como um dos seus principais produtos o ChatGPT. A primeira produz um vasto acervo de informação jornalística, e a segunda desenvolveu um sistema que opera via rastreador na web, cuja função é coletar dados para o funcionamento e treinamento de IA.
Tendo em vista que inteligências artificiais, a exemplo do chatbot online citado acima, em muitos casos, não apontam o autor original ou redirecionam à fonte e, como as matérias de jornal são disponibilizadas de forma pública, mais fácil é o acesso ao acervo produzido por ele. Como forma de contornar o impasse, ambas as entidades negociaram, por semanas, o uso autorizado dos conteúdos produzidos pelo NYT, visando, principalmente, a compensação financeira de direito autoral do jornal, porém não avançaram. O auge do conflito ocorreu no dia 3 de agosto deste ano, dia em que o NYT atualizou seus termos de serviço e bloqueou a extração do seu acervo para o treinamento dos sistemas IA.
Outro fator que impulsionou essa decisão foi a competição desleal que começou a se estabelecer entre as empresas, tendo em vista que o ChatGPT se tornou um competidor direto desse veículo, ao responder dúvidas de leitores, por exemplo, utilizando, de forma indireta, o material publicado pelo jornal sem citá-lo ou creditar a fonte, o que desviava parte dos consumidores das notícias do jornal.
O NYT cogita, então, propor uma ação judicial contra a OpenAI, porém, enfrentará dificuldade nesse processo. Isso decorre em razão da complicação em comprovar originalidade do material, em virtude do mecanismo do ChatGPT, que, ao gerar suas respostas generalistas, mescla diferentes conteúdos e faz o uso de diversas fontes, dificultando a acusação de pirataria de software.
Ficamos com a pergunta no ar, como legislar em um cenário em constante evolução? Um exemplo de medida possível seria o acordo realizado pelos Estados Unidos, Japão e outros 16 países, contando com a participação de empresas como o Google e a OpenAI, que buscam o desenvolvimento seguro da inteligência artificial, estabelecendo um projeto de criação de um banco de dados específicos para a IA utilizar, definindo, assim, diversos benefícios, a saber: a não violação dos direitos autorais e da propriedade intelectual e o aprimoramento da segurança jurídica no meio digital, sem prejudicar o desenvolvimento dessa tecnologia e o reconhecimento dos autores originais.
No Brasil, vale ressaltar o Projeto de Lei (PL) 759/23, que propõe a criação da Política Nacional de Inteligência Artificial, estabelecendo parâmetros para o seu uso no país. Dentre os seus princípios, destaca-se a transparência e confiabilidade da ferramenta, por apresentar diretrizes voltadas para a proteção do patrimônio público e privado, com a finalidade de estimular a inovação, em paralelo ao respeito aos direitos autorais e à privacidade. No momento, o PL aguarda o parecer do Relator na Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação (CCTI).
Portanto, ao analisar casos como o NYT vs OpenAI, percebemos que, cada vez mais, a sociedade estará exposta a essas inovações, urgindo a implementação responsável de uma legislação adequada à atualidade e capaz de resolver conflitos modernos.
Autora: Nathalie Simões, Sócia